André Lopes
Cirurgião Oncológico do ICESP-HCFMUSP – Instituto do Câncer de São Paulo e do IBCC – instituto Brasileiro de Controle do Câncer
Professor de Técnica Cirúrgica do Centro Universitário São Camilo
O tratamento do câncer de ovário é uma combinação de cirurgia e quimioterapia.
A cirurgia como parte do primeiro tratamento continua a evoluir e nos últimos anos houve progresso significativo, com procedimentos mais complexos e que ressaltam a importância de uma cirurgia com remoção completa de todo tumor.
Tivemos estudos sobre a cirurgia em caso de recidiva da doença, com resultados diferentes, mas que talvez sejam um caminho que nos ensine a melhor selecionar as pacientes que se beneficiem de uma segunda cirurgia.
A HIPEC, sigla em inglês para quimioterapia intra-peritoneal hipertérmica é outro assunto relevante e pode ser aplicada em algumas situações.
Tivemos avanços não apenas nas cirurgia, mas novas medicações surgiram, a exemplo dos inibidores de Parp, utilizados como terapia de manutenção e administrados após o tratamento primário ou até mesmo em casos de recidiva. Por esse motivo existe a recomendação da maioria das sociedades e guidelines que todas as mulheres com diagnóstico de câncer epitelial dos ovários sejam submetidas a teste genético.
CIRURGIA DE CITORREDUÇÃO
O nome citorredução refere-se à cirurgia para a remoção dos ovários, útero e de todos os implantes (tumores) que foram identificados durante a cirurgia. São procedimentos complexos, que muitas vezes envolvem a ressecção de outros órgãos, onde quer que estes implantes estejam. Lembrando que a grande maioria dos tumores de ovário são identificados em estágios avançados e por esse motivo essas cirurgias costumam levar horas. Via de regra, são realizados via laparotomia (cirurgia aberta) que permite uma melhor remoção de todos os implantes.
A remoção completa de todos os tumores é um dos fatores que aumenta a sobrevida, ou seja, as pacientes vivem mais e melhor. Por esse motivo é importante procurar um médico ou centro especializado que seja dedicado ao tratamento do câncer de ovário.
CIRURGIA PRIMÁRIA OU DE INTERVALO
Entenda esses conceitos:
– Cirurgia primária: quando o tratamento começa com a cirurgia;
– Cirurgia de intervalo: quando o tratamento começa com a quimioterapia, e a cirurgia é realizada após alguns ciclos;
A cirurgia primária ainda é preferível em relação a cirurgia de intervalo, desde que a paciente esteja em boas condições clínicas e que seja possível a remoção de todo tumor. Temos alguns estudos que demonstram que a quimioterapia neoadjuvante pode ser uma boa opção, principalmente para as pacientes com doença muito extensa ou aquelas que não estão em boas condições de saúde. Cada caso se apresenta de uma maneira, por isso a importância que um especialista avalie o tratamento mais adequado.
Remoção de linfonodos: um grande estudo indicou que a remoção de linfonodos não é necessária durante a cirurgia primária, desde que estes linfonodos estejam aparentemente normais. Com isso diminui-se o tempo cirúrgico e também as complicações.
HIPEC
HIPEC é a abreviação para a palavra em inglês Hyperthermic IntraPEritoneal Chemotherapy.
Este procedimento é acompanhado de uma cirurgia que chamamos de citorredução, onde os implantes tumorais são removidos. A HIPEC só é realizada se a citorredução tiver sido bem sucedida. Logo após o término da cirurgia, através de uma máquina de perfusão, os medicamentos da quimioterapia são aquecidos e aplicados diretamente no abdome para eliminar eventuais células cancerígenas microscópicas remanescentes.
Para o câncer de ovário os estudos com HIPEC foram/estão sendo realizados considerando principalmente os tipos de tumor seroso de alto grau e endometrióide.
Temos evidências científicas que a HIPEC provavelmente pode ajudar no tratamento do câncer de ovário durante a citorredução de intervalo, ou seja, naquela paciente que iniciou o tratamento com a quimioterapia e fará a cirurgia após algumas sessões, normalmente após o 3o. ou 4o ciclo.
Na cirurgia da recidiva provavelmente não tem benefício, por isso não temos indicação nessa situação.
Para indicar HIPEC durante a cirurgia primária devemos aguardar os resultados dos estudos em andamento.
Ou seja, a HIPEC pode fazer parte do tratamento em situações selecionadas, mas ainda temos como as principais opções a cirurgia, quimioterapia e mais recentemente os inibidores de Parp.
CITORREDUÇÃO SECUNDÁRIA/CIRURGIA NA RECIDIVA
O termo citorredução secundária se refere a uma cirurgia realizada quando a doença apresenta uma recidiva.
Uma segunda cirurgia (ou terceira, ou quarta e etc) pode ser uma opção de tratamento em pacientes selecionadas, principalmente nas quais a ressecção completa de todo tumor é considerada provável. Os dois principais estudos que temos hoje apresentam resultados conflitantes e devemos selecionar muito bem aquelas pacientes que venham se beneficiar, que são as que apresentam doença localizada, as que tem um bom intervalo de tempo desde o término do primeiro tratamento até a recidiva e que estão com boas condições clínicas.
Referências:
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International Journal of Gynecologic Ca